Pirei no Conto

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segunda-feira, 25 de maio de 2015

O Balão Azul - Primeira Parte

"Um menininho descobre o poder da sua imaginação... Vai um conto aí?"









O Balão Azul

André observava os pais colocando os balões azuis por toda a sala de sua casa. Era a cor favorita dele. O garoto de seis anos levou seu urso de pelúcia a tiracolo até a cozinha, e abriu a geladeira.

                - Tá vendo, Antônio? É o meu bolo de aniversário.

                Mas o urso nada respondeu.

                Às cinco horas chegaram os convidados. Algumas crianças da idade de André, junto com os pais. Alguns deles eram colegas de escola: duas meninas e três garotos. Completava a trupe duas garotas vizinhas ao apartamento dele. Uma delas um pouco mais velha que André, a outra uma criança de colo. 

                A mãe de André pôs música para animar as crianças, mas elas já tinham ido para a sacada protegida por uma rede de segurança, todas atrás dos brinquedos espalhados ali.         

Uma das mães percebeu André sozinho em um canto, conversando com seu ursinho.E levou-o para se enturmar com os outros.

Mas assim que ele chegou, as crianças começaram a caçoá-lo, como já faziam no colégio:

                - Você de novo com esse ursinho?

                - Isso é coisa de criancinha!

                E André se afastou de novo, escondendo-se no espaço entre o sofá e a parede, chateado.

                - Estou triste, Antônio.

                E abraçou o urso, que novamente não respondeu.

                A garota vizinha, aquela mais velha que Antônio, sorrateiramente entrou no corredor, e viu a porta do quarto de Antônio entreaberta.

                Abriu um pouco mais a fresta, e viu deitada numa das camas uma garota de 16 anos, os olhos fechados, ligada a um aparelho de hospital.

                Afastou-se imediatamente dali, assustada. E foi ter com a mãe:

                - Mãe, vi um fantasma ali no quarto!

                A mãe, sabendo do que se tratava, e não sabendo como lidar, deu uma bronca:

                - Não fala isso pra ninguém! E para de bisbilhotar! Vai brincar!

                E ela foi conversar com as meninas.

                Vendo que a garota que se aproximava não tinha nenhuma boneca, uma delas tentou ser convidativa:

                - Você não trouxe a sua Barbie? Eu posso emprestar uma das minhas...

                - Tem um fantasma no quarto do André, vocês querem ver?

                As duas a seguiram, e foram ter no quarto. Riram nervosas entre si.

                - Parece que tá dormindo.

                - Será fantasma mesmo?

                Mas um dos pais viu a cena, e foi empurrando as garotas para fora dali:

                - Está na hora dos parabéns. Vamos, crianças.

                A mãe de André punha as velas no bolo, mas aonde andaria o menino?

                A babá descobriu o esconderijo do garoto:

                - Vem aqui já, que sua mãe tá esperando!

                A mãe de André acendeu as velas, apagaram as luzes.

                “Parabéns pra você...”

                “...ra-tim-bum! André! André!”

                As crianças cataram afoitas os brigadeiros. E enquanto o pai de André cortava o bolo, a mãe, discretamente, foi até o quarto fumar. Não se sentia bem.

                A essa altura, todos os colegas de André já sabiam do “fantasma” no quarto dele. E recomeçaram as brincadeiras:

                - André mora com o fantasma! André mora com o fantasma!

                André, assustado, procurou seu pai:

                - Papai, onde está a mamãe?

                - Lá no quarto. Mas deixa ela quieta um instante, tá, André?

                Mas André não ouviu o resto da frase. E foi correndo até o quarto da mãe.

                Quando entrou no quarto, deu com as luzes apagadas, a mãe triste fumando na janela.

                André não gostava quando sua mãe fumava.

                Ela soltou uma lágrima. E em seguida começou a soluçar chorando. Falava baixinho, para si mesma:

                - Minha mãe!... Minha rainha!... Como eu precisava de você, mãe...  Como eu precisava de você agora... Eu não sei o que fazer... Você gostava tanto da Andréia...

                André apertou  o ursinho contra o peito, com raiva. O aniversário era dele, não da sua irmã. Não era justo!

                Mas ficou confuso. Como assim sua avó era uma rainha?

                - André, eu disse pra você não incomodar sua mãe.

                O menino se virou. Era o pai.

                Mas a mãe notou a presença do marido e do filho:

                - Deixe. Venham pra cá vocês dois.

                A mãe enxugou as lágrimas, e se recompôs. Apagou o resto do cigarro no cinzeiro à beira da janela. Não gostava que o filho a visse fumando.

                E quando o garoto se aproximou, pôs as mãos sobre os ombros dele, colocando-o carinhosamente à sua frente. O pai a abraçou por trás.

                - Estão vendo essa noite estrelada? Está lindo, não é?...

                E André admirou aquelas estrelas todas. Não havia lua, o céu estava sem nuvens.

                - Sabia, André, que era um sonho da vovó andar de balão? – revelou a mãe. Retrucou com o marido:

 – Querido, será que um dia a gente não podia andar de balão, nós três?...

                - E como a gente ia fazer com a Andréia? Quem ia cuidar dela?...

                - A gente dava um jeito... – respondeu a mãe, sem esperanças – Meu Deus, por que eu deixei ela acampar com aqueles garotos... – lamentou.

                Seus olhos se encheram de lágrimas outra vez.

                - Vamos, meu bem. A babá está cuidando dos convidados, mas daqui a pouco vão dar pela nossa falta – disse o pai, de forma prática.

                - A gente devia arranjar outra babá. Às vezes acho o André muito calado.

                - Impressão sua, meu bem. Vamos.

                Depois da festa, mais uma vez André custou a pegar no sono. O aparelho da irmã fazia um barulhinho de respiração às vezes... E o menino ficava com medo dela.

                De madrugada, teve um pesadelo:  Andréia se levantava, e de pé no meio do quarto, ficava chamando o nome de André. E ele se agarrou forte ao ursinho.

                Mas sem resultado. De manhã, a cama amanheceu mais uma vez molhada de xixi.

                No colégio, a história do fantasma se espalhou. Na hora do recreio, todos continuavam atrás de André:

                - Mora com o fantasma! Mora com o fantasma!

                Até que André ficou furioso:

                - Não é fantasma! É a minha irmã!

                Mas foi aí que pegaram no pé mesmo:

                - Irmã-fantasma! Irmã-fantasma!

                - É verdade que mora uma bruxa com você também, André? – riu-se um deles.

                E André xingou todo mundo:

                - Vocês são uns bundas-moles!

                Não sabia o que queria dizer bunda-mole. Só tinha ouvido o pai dizer isso uma vez no telefone, muito bravo. Então devia ser algo feio.

                E foi correndo com o ursinho para outro canto do pátio.

                Os garotos não perdoaram:

                - Ah, deixa ele! É nenenzinho... Fica andando com aquele ursinho!

                Quando a babá foi buscar, André estava bravo.

                - Que que aconteceu, André?

                - Os meninos brigaram comigo.

                - Mas você também é um bobo. Por que não briga com eles também? Só fica andando com esse ursinho besta debaixo do braço...

                 E assustado com a resposta atravessada, André se calou.

                Depois do almoço, André foi brincar com os lápis de cor na sala, enquanto a babá lavava os pratos na cozinha.

                Olhou um pouco para a foto da avó, no porta-retratos, em cima do aparador.

                Desceu da cadeira da mesa de jantar, e mirou a foto mais de perto.

                A avó de André aparecia dando aquela risada gostosa que ele lembrava tanto. As mãos cheias de anéis dourados, usando também pulseiras da mesma cor. Os cabelos grisalhos e curtos.  Um vestido rosado, com uma flor de tecido, também rosa, costurada perto do coração. Nas orelhas havia um par de brincos grandes, cor de prata,com pedrinhas azuis.

                André se admirava. As pulseiras deviam ser de ouro... E aquelas pedrinhas... Pedras preciosas.

                A vovó, rainha? Será que era?

                A mãe tinha explicado a André que a vovó estava no céu.

Devia estar gostando de ficar lá em cima. Afinal, o sonho dela não era andar de balão?

                E André teve uma ideia.

                Pegou o lápis com a cor azul, a sua favorita, e foi até o quarto.

                E começou a rabiscar a parede.

                Fez um grande balão. No cestinho, ele, a mamãe e o papai.

                E embaixo, desenhou uma cama pendurada ao cestinho, com Andréia deitada.

                Ela também ia poder viajar com eles de balão.

                - O que você tá fazendo, moleque?

                Era a babá. Estava furiosa. E pegou ele pelo braço.

                - Tá machucando!...

                - Eu devia era dar uma surra em você! Mas espera só chegarem os seus pais do serviço...

                E colocou ele à força sentado na poltrona, de frente para a TV.

                - E você não inventa de sair daí. Vai ficar quietinho, até os seus pais voltarem!

                André começou a chorar.

                - Eu quero o Antônio.

                - E nada de ursinho. Ora, menino besta, desse tamanho... E engole esse choro!

                Mais uma vez assustado, André ficou quietinho, vendo o desenho que passava. Era do Pequeno Príncipe. O príncipe morava em um planeta pequinininho... Despedia-se de uma rosa, debaixo de um vidro. E depois saía voando, segurando um monte de fios pendurados em passarinhos. Eles voavam para longe... E o principezinho com eles...

                A mãe chegou em casa. Abriu a porta, e deu de cara com André na poltrona.

                Olhou para ele, estranhando o filho tão silencioso.

                - O dia foi bem? – conversou com a babá.

                - Foi... Mas eu queria que a senhora visse uma coisa!

                E levou a mãe de André para dentro do quarto. Ao lado da filha deitada, um desenho azul tomava a parede.

                A mãe chamou André. Não achava tão ruim assim o filho ter riscado a parede do quarto. Mas sob o olhar ferino da babá, sentiu-se insegura, e chamou o filho:

                - Meu filho, você entendeu que não pode riscar a parede?

                - Mas, mamãe, eu só queria...

                - André...

                - Desculpa, mamãe.

                E abraçou as pernas dela.

                - Tudo bem. Mas hoje você fica sem sobremesa. E vai ficar de castigo no quarto, sem brincar.

                E enquanto André ficava sentado na cama, com Antônio no colo... A babá desfazia o desenho do balão com um pano e um balde d’água. Mas olhava André de soslaio, com ar satisfeito.

                À noite, o pai acordou com um telefonema. Atendeu, e a mãe perguntou o que era. A babá passara mal em casa. Precisaram levá-la às pressas ao hospital. Era uma das filhas, e dizia que sua mãe precisaria ficar alguns dias internada. Desconfiavam que fosse dengue.

                - E agora, com quem a gente vai deixar o André?

 "E agora? Com quem ficará André? Será que aquela babá esquisita ainda volta? E Andréia, será que acorda? Ufa, ainda bem que tem a segunda parte do conto! Não deixe de acompanhar!"

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